Leitor na cultura: a promoção da leitura infantil e juvenil

Autor: PERROTTI, Edmir

Nível: Tese ( Doutorado ) Ano: 1989 Orientador: Jerusa de Carvalho Pires Ferreira

Foco Temático: Leitor: Preferências, Hábitos, Representações e Histórias

Instituição: Escola de Comunicações e Artes, USP Cidade/Estado: São Paulo/SP

Descrição: A partir de fins dos anos 60 e início dos 70, começou a intensificar-se no Brasil um movimento visando à promoção da leitura de crianças e jovens. Reunindo segmentos diversos, ligados à problemática do livro e da leitura infantil e juvenil, esse movimento tomou as feições de um "pacto" cultural, segundo orientações formuladas e centralizadas pela UNESCO e suas agências, entre elas, a International Board on Books for Young People (IBBY), representada no país pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), entidade criada em 1968 e sediada no Rio de Janeiro. A adesão irrestrita às premissas promocionais internacionalistas significou, entre outras coisas, aceitação acrítica de uma política cultural que teve na conciliação ponto de referência para suas ações conforme revela o estudo dos artigos publicados nos 70 números do Boletim Informativo da FNLIJ objeto desta pesquisa. O "pacto" sem se importar com diferenças contextuais reais e de toda espécie, procurará reunir interesses gerais nacionais e internacionais preocupados em integrar populações infantis ao circuito do livro e da leitura, partindo de pressupostos salvacionistas que julgam a leitura enquanto instrumento civilizatório por excelência, capaz de livrar o mundo dos perigos da barbárie e das trevas. A velha concepção salvacionista de leitura não impediu o "pacto" de adotar novos parâmetros de intervenção na cultura. Assim, o filantropismo ingênuo das antigas promoções foi modernizado, assumindo um caráter competente, em consonância com as exigências tecnoburocráticas dos novos tempos. Todavia, o tecnicismo modernizante não conseguiu esconder a característica básica da tradição conservadora: outorgar arbitrária e artificialmente (sua) cultura àqueles que supõe sem cultura. Esse neo-filantropismo desenvolveu novas estratégias promocionais, criou técnicas de animação de leitura, a serem exploradas de preferência em instituições especializadas de educação e cultura (Escolas, Bibliotecas, Centros de Cultura). Dado, porém, que em países como o nosso essas instituições estão sujeitas a condições de extrema precariedade, as propostas não terão meios para se realizar de modo como foram concebidas. Quando muito, se ajustarão à precariedade reinante, disso resultando um ativismo cultural inconseqüente, incapaz de responder aos desafios que a leitura de crianças e jovens nos coloca nos dias de hoje. No âmbito do "pacto", as soluções não conseguem ultrapassar níveis técnico-administrativos, enfocados sob ângulos tecnoburocráticos, segundo o qual, através de ações bem planejadas, bem administradas, aliadas a técnicas de produção de estímulos (a animação da leitura) em instituições especializadas, conseguir-se-á criar os ditos hábitos de leitura na infância. Tal visão administrativa, tecnicista da leitura e da ação cultural põe de lado as relações profundas existentes entre o ato de ler e a participação na vida cultural. Assim, desconsidera o fato de a infância viver, cada vez mais em nosso mundo, confinada em espaços públicos onde a cultura é gestada, criada, recriada: desconsidera que, sem vínculos com o espaço da cultura, sem condições de estabelecer confrontos entre a leitura da palavra e leitura do mundo, a criança percebe a leitura como algo estranho que não lhe concerne, como comportamento sem ressonância social e, enquanto tal, dificilmente assimilável através de artifícios técnico-administrativos. Em casos como o brasileiro, acrescente-se a tal quadro a falta de tradição do impresso na vida social e o círculo da rejeição estará fechado. Vencer, pois, o confinamento cultural da infância é condição que se impõe para se fazer frente à dita crise da leitura. Se, como quer o "pacto", a infra-estrutura educativo-cultural é indispensável ao projeto, sua redefinição no sentido de que ela possa atuar como agente de "desconfinamento" da infância também o é. Ao mesmo tempo, a redefinição das relações adulto-criança que ocorrem no interior das instituições especializadas é indispensável e passo importante para a criação de vínculos consistentes entre infância e leitura. Nesse sentido, vencer as concepções teórico-práticas de leitura e de sua promoção atualmente em vigor parece caminho que se impõe a quem deseje o ato de ler resgatado em suas possibilidades culturais plenas. E resgatá-lo significa sobretudo resgatar a participação do leitor na cultura.

Fonte: Tese